Esse negócio de linguagem falada e linguagem escrita, ou culta, eu conheço. Passei por isso por várias vezes. Algumas situações até esqueci. Outras não!
O primeiro choque, que eu me lembro, foi quando comecei ir à aula. Minha idade era de seis para sete anos. Mais da metade da turma não falava português. Falava o alemão não gramatical. Uma mistura de dialeto germânico, entremeado do “brasilero”. Eu, como morava perto da escola, e brincava com os filhos da professora, falava as duas línguas e estava indo à escola para aprender uma terceira. Sendo assim passei a ser o tradutor entre a professora e os alunos de “origem” e, ainda, entre esses e os que falavam o português.
Daí nos apresentaram a outra linguagem - a escrita. Neste caso o furo era mais embaixo. Pensando agora, distante mais de quatro décadas, fico imaginando as dificuldades da pobre professora. Como ela se virava? Como conseguia ensinar numa turma tão díspar?
Cursei da primeira à quinta série, e, como estava com onze para doze anos, meu pai falou – Tu é muito novo para ir à roça o dia todo. Vai à aula de manhã e repete a quinta série, - que era o máximo naquela escola rural-, e à tarde pega o cabo da enxada.
Pois foi assim que me vi, apesar de ter notas boas, repetindo a quinta série. Para minha sorte, ou azar, veio um professor novo. Seminarista, moderno, jovem, e, para dificultar e destacar às diferenças, oriundo da cidade. As primeiras aulas foram conversas onde o professor tentava mostrar para nós como é que se falava corretamente na civilização oficial, não a nossa realidade.
- Não se fala botar. Quem bota ovo é galinha. Se diz põe!
A maior dificuldade do novo mestre, foi nos convencer a pronunciar os dois erres juntos (rr) aspirados, fortes, e palavras iniciadas com esta letra Foi um sacrifício, prá mim, declamar a poesia no dia sete de setembro.
- Amo-te oh minha “tera”!
Por tu que me tens dado.
Pelo azul do teu céu.
Pelas estrelas, pelo mar!
Pelo crepúsculo profundo...
Sofremos. Sentimos pressão. Aos poucos fomos aprendendo. Gradualmente o mestre ia trazendo informações novas e exóticas para a turma, até que um dia veio com essa:
- Não se fala internacional! Fala-se internacionau!
Nesta época ninguém falou para nós alunos, que era luta de classes, pressão do poder dominante querendo impor a linguagem, a cultura, aos desfavorecidos e menos cultos. Para nós era normal. Estávamos aprendendo, o que não era pouco, e nada mais.
Agora vem o MEC, com livros didáticos mal escritos, com erros de linguagem, tentando se justificar que no “politicamente correto”, não se pode forçar e deve se respeitar o ambiente de cada um. A origem social.
Respeitar sim é claro, mas afinal não se vai à aula para aprender?
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