sexta-feira, 7 de maio de 2010

Apelidos


Tem gente com habilidade especial para colocar apelidos nos outros. Às vezes nele não pega. Mas quando pega, pega bem.

Os apelidos aparecem nos grupos de amigos, na escola, no trabalho, ou seja, sempre entre pessoas conhecidas. É preciso convivência e conhecimento entre o “apelidado” e o “apelidador”. E mais, é necessário um grupo que, de antemão, conheça bem a vítima, sua história, seus trejeitos e defeitos, e principalmente suas virtudes. Isso é muito importante.

Qualidades de quem recebe apelido é uma coisa importante, pois em geral não de põe apelido por botar em alguém desvalido. Apelidar é uma forma de externar ciúmes e até de vingança algumas vezes. O apelido tem que colar e calar fundo. De preferência o apelidado deve acusar o golpe e sentir na pleura irritando-se e assim pegar em definitivo.

Dar apelidos não é para qualquer um. Tem que ter malícia, criatividade, senso de humor, oportunismo e muita perspicácia. O sujeito está na roda, joga o apelido e pronto, pega pra já.

A forma, motivo e lugares, onde nascem os apelidos são variados. Tenho um conhecido que contou uma piada. Na tal estória tinha um tourinho de Bagé. Prá quê. Ninguém mais lembra da piada, mas o apelido pegou: tourinho.

Alguns têm cara de alguma coisa. Jacaré, certinho, índio, bonitinho, meio quilo, todo duro. Outros cometem um deslize, fazem uma pergunta fora da hora ou cometem algo fora do contexto e pronto, o apelido pega. E assim conhecemos o mijão, o dorminhoco, o bocão, o perigoso, o panela, o peraí, o tá legal, o lobo-mau. A cor do cabelo pode intuir um apelido tal como o sarará. Neste caso conheci o gamerial, que um tipo de pó de gafanhoto branco-amarelado, bem da cor do cabelo.

Grandes apelidos trazem no seu bojo uma grande estória. Outros diagnosticam qualidades (ou defeitos) e mais, nos deixam extremamente curiosos. Na verdade um apelido fora do contexto social do grupo parece desfocado. Sem graça. No grupo de convivência, no dia-a-dia, representa e carrega consigo muito mais que um simples “nome”. Carrega toda uma história.

Tomando um cafezinho num boteco, vi o dono do bar chamar alguém de “meio-loco”. De vez em quando volto meu pensamento ao acontecido e desenvolvo uma tese para tal. Vejam só, se fosse “loco” estaria definido. Mas não é. É “meio-loco”, ou seja, deixa dúvidas e por si só demonstra bom humor e perspicácia de quem colocou o apelido.

Outros apelidos carregam em si uma dose, menor ou maior, de diferentes preconceitos. Quem não conhece o “tição”, “o branca-de-neve”, “o meia-noite”, “o vampeta” e por aí vai.

Conheci um apelido que para mim batia todos. Misto de raiva e chacota. Chamar alguém de cachorro já é forte. Cadela então é agressão. O nome do cara era João e trabalhava como fiscal na alfândega tentando controlar o comércio formiga entre Brasil e Argentina. Contava os produtos, pesava a farinha e confiscava o que passasse da cota.

Um dia desses um coitado de um chibeiro não se conteve e, com toda carga de raiva, soltou – João Cadela!

O povo não teve dúvidas o apelido pegou e se espalhou mais que fogo ladeira acima, no capinzal seco, em dia quente de ventania.

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