sexta-feira, 7 de maio de 2010

Vila Miúdo


Vila Miúdo ou Vila do Miúdo. Ou simplesmente Miúdo. Não conheço em profundidade a história. Mas seguramente o primeiro nome Feijão Miúdo, nasceu devido a planta, que certamente serviu de alimento aos pioneiros. Mais tarde o nome mudou para Padre Gonzales.

Miúdo é um naco de terra vermelha, pertinho de Três Passos. Tem, ou tinha?, como atrações principais: o clube de Futebol Paladino, o Clube Ipiranga, o Ônibus Toda-Hora, que em dias de chuva trafegava com maravalha na escada, a Rodoviária, só o banco da Rodoviária já valia o ingresso, o Posto de Gasolina, suas quatro igrejas, o Bolão, o Hospital, a Cooperativa Mista Agrícola, o Cemitério, o Salão de Molas, o Munho. Desculpe-me, senhores e senhoras, se algumas das atrações já não existem fisicamente, nas minhas lembranças estão muito vivas.

O Cirquinho armado no que se dizia praça, o homem magro que tremia exageradamente. Hoje eu sei: Mal de Parkinson. Em cada esquina um bêbado dando show. Os meninos vendedores de picolés, pastéis e pés-de-moleque. Como havia pães gostosos na Vila. O pão d'água ou sovado de meio quilo, lembram? E o pãozinho doce? O único táxi, um corcel 73 antigo, azul-calcinha, chorava numa primeira. Piás jogando bolitas pelos pátios e calçadas. O velho Fenemê - FNM, sem pressa, fumava nas ladeiras. Vacas e cavalos pastando na soga. A festa do Colono e do Motorista. Terrenos baldios com barba-de-bode. Será que ainda existe barba-de-bode no Miúdo?

A Vila era feito destas coisas: barba-de-bode, terra vermelha que se transforma em barro ou poeira dependendo do clima, bêbados, pão doce. Sem isso o Miúdo perde sua alma. Sua identidade.

Brinquei muito nos campinhos e ruas do Miúdo. Andei de bicicleta, brinquei com os carrinhos do Néco, filho de Margarida, a saber, a parteira mais conhecida da região.

Tomei muita gasosa. Chupei muitos picolés e sorvetes no Bar e Bolão do seu Weber. Jogue bolitas na areia das sarjetas. Anos mais tarde, adolescente, estudei no Colégio CNC Rio Branco à noite. Aliás, eu sou da famosa turma do Lobo-Mau, que fez história.

Tenho muitas e boas lembranças da Vila. É um lugar simples. Não é cidade, nem interior. Nem urbana, nem rural. Uma aldeia misteriosa e profundamente humana.

Suas qualidades e defeitos aparecem ao natural. Impossível não mostrar. O tempo passou, mas alguma coisa diferente continua existindo na Vila do Miúdo. Difícil concluir com palavras. Fácil perceber, para quem conhece e mergulha na alma boêmia da Vila. Suas gentes, sua casas, seus arvoredos. Seus bueiros e cercas. Pomares e jardins. Igrejas, botecos, marcenarias, casebres, barbearias e açougues.

Por um descargo de consciência, confesso algumas coisas mal resolvidas no Miúdo:

1 - Tive uma grande paixão. Não sei se correspondida. Secreta: só eu sabia. Nem a minha amada suspeitava. Coisas de adolescente. Isso não mais se conserta. O tempo passou...

2 - O salão-de-molas. Não é lenda. Existiu de verdade aí na vila. Perguntem aos mais velhos. Minha decepção é que eu nunca fui a um baile no salão-de-molas. Imaginaram? Eu, que danço valendo, com molejo, seria um abraço. Não existe mais. Quem dançou, dançou! Quem não dançou...

3 - Nunca joguei bolão à vontade no Clube Ipiranga. O clube ainda existe. Espero que o bolão também e, assim posso matar esta minha vontade...

4 - Gostaria de um dia desfilar na festa do Colono e do Motorista e depois comer um pedaço de boi assado inteiro, com salada de batata, cuca e cerveja. É a melhor coisa do mundo.

Qualquer hora vou aí corrigir estas falhas da minha modesta biografia.

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