sexta-feira, 7 de maio de 2010

Sonho de pedra



No alto da montanha, pertinho do céu, vivia um grupo de pedras bem grandes. Matacões, rochas, que pela energia de algum vulcão ali foram depositadas. E elas observavam os pássaros voarem, sentiam o vento, a chuva e conversavam entre si.

- Eu tenho um sonho, dizia uma. Ainda quero conhecer o mar.

- Eu quero aprender a voar, dizia a vizinha.

- Sonho impossível o seu. Imagine uma pedra voar.

- E você sua boba. Imagine pedra nadar. Pois vais ter que nadar para chegar até o mar.

- Se for preciso eu aprendo nadar. Ainda vou conhecer o mar.

O tempo foi passando. A pedra, sem pressa, no alto fazia planos.

Certo dia a chuva foi muito forte e deu uma enxurrada grande. A pedra, que sonhava com o mar, jogou-se na correnteza e desajeitadamente saiu rolando montanha abaixo. Batendo em outras pedras foi tirando lascas e deixando pedaços. Sentiu então na pele que o caminho até o mar não seria fácil. Não aprendia nadar de jeito nenhum, além disso, tinha que lutar e se atirar contra outras rochas para abrir espaço e seguir adiante. A cada parada avaliava e concluía que já não era a mesma pedra. Ia ficando aos pedaços na descida. E o pior: não tinha como voltar.

Vieram outras enxurradas, avanços, sustos e sofrimentos, concluiu que virara seixo que rola. O avanço tornara-se mais fácil, porém as dificuldades continuavam. Nadar? Nem pensar, vivia rolando e batendo em outros seixos no fundo do rio, ora à margem direita, ora à outra. Quando imaginava que já não diminuiria, levava outro safanão e o desgaste continuava. Ficava cada vez menor e roliço. Ainda não chegara ao mar e estava longe da montanha e com saudades. Voltar não dava. O jeito era seguir adiante e quem sabe um dia chegar ao mar.

Entre enchentes e solavancos, virou grão de areia e um dia sentiu a água salgada.

Cheguei ao Mar! E até já sei nadar.

Brincava no mar, nadava, mal, mas nadava, afinal realizara seu sonho. Perguntava-se : - ainda tenho alguma coisa daquela rocha do alto da montanha?

E entre milhões de outros grãos de areia tomava banho, mergulhava, conversava, e se divertia nas ondas. Encontrou mãe d’água, tubarão, peixinhos, lagosta, estrela do mar ...

Um dia nadou até a praia. A maré baixou, o sol saiu e o grão de areia ficou admirando o céu, as gaivotas, as montanhas ao longe e pensou:

Tenho um sonho. Quero aprender a voar igual aos pássaros e voltar às montanhas de onde vim. Tenho saudades de lá e preciso contar, a quem ficou, a minha aventura.

Conheci o mar, aprendi a nadar. Coisas que pareciam impossíveis para mim. Por quê não poderei voar? Está certo, mudei muito. Estou leve, mas ainda tenho sonhos.

Esqueceu-se na praia. Veio o sol forte e a areia secou. Soprou o vento e quando o grão de areia se apercebeu estava voando de duna em duna.

Já sei voar, já sei voar, gritava entusiasmado.

- Posso voltar para a montanha de onde vim, esse é meu sonho!

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